Esse foi um dos principais temas debatidos no Seminário “Tráfico de pessoas, vulnerabilidades e violação de direitos: quem são as vítimas?”. O evento on-line, realizado pela Câmara Técnica de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas de Foz do Iguaçu (CTETP/Foz), aconteceu no mês julho e contou com painelistas que são profissionais atuantes na área e ainda participantes dos estados de São Paulo, Ceará e Pernambuco, e das cidades de Campo Grande (MS), Manaus (AM), Poços de Caldas (MG), Florianópolis (SC), Brasília (DF), Castanhal (PA), Pelotas e Santa Maria (RS) e Curitiba, Foz do Iguaçu, Umuarama, Ponta Grossa, Medianeira e Santa Helena (PR).
Em todos os debates, ficou evidente a necessidade de a sociedade se envolver na conscientização, conhecimento e identificação de vítimas do tráfico. Esse foi um dos motivos pelos quais o tema do seminário abordou a pergunta: “quem são as vítimas?”
Dentre as características comportamentais e físicas para identificação, Matthew Nau, que é Agente do Serviço de Segurança Diplomática do Departamento de Estado dos EUA, citou que, normalmente, a vítima não parece ter controle sobre a própria vida, aparenta ter sido privada de alimento, água e sono, não tem pertences pessoais, tem uma condição de vida instável e até tem problemas de memória, além de poder sofrer de depressão e ansiedade e desconfiar de pessoas em posições de autoridade, como a polícia. João Gabriel Dadalt, Chefe do Serviço de Direitos Humanos da Polícia Rodoviária Federal, comentou:
“Há pessoas resgatadas do tráfico que vivem em situação de exploração da força de trabalho que não sabem nem o local onde estão e não se enxergam como vítimas. É aí que entra o sério problema da desigualdade social, porque essas vítimas vivem em condições precárias, mas, quando sobra R$ 150,00 para a pessoa mandar algum valor para a família, ela já tende a achar que o trabalho está dando certo. Ela não tem referências de condições de vida adequadas”.
No caso de vítimas do tráfico para fins sexuais, outras características que podem ser indício do crime são: ferimentos, cortes e queimaduras, vício em drogas ou álcool, usar gírias associadas à prostituição, passar tempo com outras pessoas que demonstram os mesmos indicadores de tráfico e frequentar os mesmos locais anualmente ou sazonalmente.
A Professora do Perry Center for Hemispheric Defense Studies, Celina Realyo, destacou:
“Temos que educar mais pessoas para que elas possam identificar com mais facilidade o tráfico de pessoas, identificar as redes criminais, atacar os fluxos financeiros ilícitos, endurecer as penas e reabilitar e cuidar das vítimas. A cooperação internacional é fundamental para o combate ao tráfico de pessoas”.
Luciano Stremel Barros, Presidente do Instituto de Desenvolvimento Econômico e Social de Fronteiras (IDESF), complementou: “O enfrentamento ao tráfico de pessoas é um dos grandes desafios nas áreas de fronteira. Há um tripé que norteia o combate a este tipo de crime: a prevenção, o acolhimento às vítimas e a repressão, que requerem integrações internas, entre as organizações nacionais, e também externas, para que em conjunto com os países na origem deste problema possa ser praticada a prevenção e se evite que esse crime se desenvolva”.
A Cônsul do Brasil no Uruguai, Ana Beltrame e o Secretário do Projeto Resgate, Marco Aurélio Sousa, trabalham em organizações que acolhem as vítimas do tráfico e falaram sobre a necessidade de dar condições para que a vítima reconstrua a sua vida. O Procurador do Ministério Público do Trabalho (MPT), Fabrício Gonçalves de Oliveira, utilizou como exemplo a cidade de Foz do Iguaçu, onde há uma facilidade de transitar entre as fronteiras.
“É comum ver nas ruas da cidade crianças paraguaias acompanhadas de adultos. É uma situação difícil porque quando toda a rede de proteção se depara com essa realidade, muitas vezes essas crianças são devolvidas aos seus lares, que ficam no Paraguai. Então se tem dificuldade de fazer um acompanhamento contínuo”.
Dentre os encaminhamentos relacionados ao combate ao tráfico de pessoas, o Secretário Nacional de Justiça/Ministério da Justiça, Cláudio Panoeiro, disse que no final do mês de julho será celebrado um acordo de cooperação técnica com a secretaria de assistência social para usar as estruturas dos Centros de Referência Especializados de Assistência Social (CREAS) e Centro de Referência da Assistência Social (CRAS) para o enfrentamento.
“Ofereceremos uma capacitação para que os servidores consigam identificar possíveis vítimas do tráfico de pessoas e oferecer assistência necessária para a recuperação. Vamos aproveitar estruturas já existentes e extrair delas todas as potencialidades”. Em relação às campanhas de prevenção, o jornalista Leandro Barbosa falou sobre a importância de as narrativas ilustrarem situações reais para fazer com que as pessoas entendam de que forma acontece o crime, já que o tráfico de pessoas normalmente está relacionado a ofertas de trabalho e, dessa forma, demandam sempre uma apuração das vítimas em relação à veracidade das propostas que tenham recebido.
Sobre a Câmara Técnica
A CTETP está vinculada ao Gabinete de Gestão Integrada Municipal (GGIM) e é composta por um grupo de entidades de Foz do Iguaçu, entre elas o Instituto de Desenvolvimento Econômico e Social de Fronteiras (IDESF), Caritas, grupo Jocum (Jovens com uma Missão), Guarda Municipal, Polícia Rodoviária Federal (PRF), Casa do Migrante e Secretaria Municipal de Esportes. O patrocínio das ações é da Itaipu Binacional. “Com esse evento, a Câmara Técnica se une às ações da ONU, na Campanha Coração Azul e cumpre seu objetivo de esclarecer e engajar a sociedade para o enfrentamento do tráfico de seres humanos”, ressaltou a coordenadora da CTETP/Foz, Rosane Amadori.
Para assistir ao Seminário
Os vídeos do evento estão disponíveis no canal do Youtube do IDESF. Para acessar, clique aqui
Fonte: IDESF