O médico Mauro Tamessawa, do Hospital de Clínicas (HC) de Curitiba, usou as redes sociais para compartilhar um relato e expressar parte da angústia que tem sentido durante a atuação na linha de frente no combate à Covid-19. O profissional da saúde expôs, neste sábado (27), o caso de uma paciente jovem que morreu em decorrência da doença após ser intubada.
“Domingo tive um caso de COVID muito grave numa mulher jovem, 29 anos, mãe de 3 filhos. Era necessário colocá-la na ventilação mecânica. Quando falei para ela isso, ela ficou com muito medo, desesperada”, disse Tamessawa em sua publicação no Facebook.
O médico afirmou que a mulher chegou a fazer um pedido antes de ser intubada: “Antes de sedá-la ela me pediu que se não conseguisse tirar o tubo dela, que era para não a acordar, pois não queria mais sofrer… muito triste”.
A morte, porém, aconteceu. Mauro relatou ter chorado a partida dela. No entanto, explicou ter agradecido a Deus por ter ligado à mãe da jovem para que ambas pudessem se despedir antes da intubação.
“Estava com muita pressa pois tinha outras 100 coisas para fazer, muitos pacientes para avaliar, mas como pensei que aquele podia ser o último momento das duas, achei que era o melhor a ser feito”, escreveu.
Sobrecarga
O cansaço físico e o desgaste emocional daqueles que acompanham diariamente a luta dos pacientes infectados pela doença que já matou mais de 300 mil pessoas no Brasil evidenciam um cenário caótico e desesperador.
Por de baixo dos equipamentos de proteção individual (EPIs) há histórias, medos, preocupações, estresse.
O médico do HC também relatou como tem sido a rotina de trabalho no maior hospital do Paraná. “A tarde e fim de semana eu fico com mais 1 colega gerenciando 3 andares do hospital, com aproximadamente 60-70 pacientes COVID, praticamente todos precisando de oxigênio, e cada vez mais pacientes precisando de cuidados dados em uma UTI”, descreveu.
“A gravidade dos pacientes tem só subido nas últimas semanas. Cada vez doentes mais graves e complexos”.
A afirmação sobre o novo perfil dos pacientes que tem sofrido com o agravamento do coronavírus é o que os médicos da linha de frente têm percebido nas últimas semanas. O aumento de internações de jovens com idade entre 30 e 50 anos e sem doenças prévias preocupa as autoridade sanitárias.
“O aspecto clínico dos pacientes é diferente daquele que víamos na 1ª onda. Antes eram idosos e portadores de doenças crônicas, o que chamamos de comorbidade. Hoje é de 60% mais jovens, na faixa de 30 a 50 anos, sem doença prévia. E o tempo que estão ficando na UTI é maior. Tínhamos antes média de 7 a 10 dias de internação, agora está em 14 a 17 dias de internação no mínimo em UTI”, disse o secretário de Saúde do Estado de São Paulo, Jean Gorinchteyn, no início de março deste ano.
Relato na íntegra
Tem sido muito cansativo o trabalho no hospital. Essa semana foi muito F&%#! Para entender a rotina de trabalho no hospital, a tarde e fim de semana eu fico com mais 1 colega gerenciando 3 andares do hospital, com aproximadamente 60-70 pacientes COVID, praticamente todos precisando de oxigênio, e cada vez mais pacientes precisando de cuidados dados em uma UTI. Claro que contamos com vários residentes, mas ainda assim é muito puxado. A gravidade dos pacientes tem só subido nas últimas semanas. Cada vez doentes mais graves e complexos.
Mas apesar da guerra que estamos vivendo, temos que achar forças e tempo para sermos humanos e pacientes.
Domingo tive um caso de COVID muito grave numa mulher jovem, 29 anos, mãe de 3 filhos. Era necessário colocá-la na ventilação mecânica. Quando falei para ela isso, ela ficou com muito medo, desesperada. Tentei confortá-la, dizendo que era o melhor a ser feito e a única possibilidade para ela continuar sua luta pela vida. Antes de sedá-la ela me pediu que se não conseguisse tirar o tubo dela, que era para não a acordar, pois não queria mais sofrer…muito triste. Fizemos o possível, mas ela infelizmente não acordou…chorei após a partida dela. Mas agradeci à Deus que antes da intubação, liguei para a mãe dela para que se despedissem. Estava com muita pressa pois tinha outras 100 coisas para fazer, muitos pacientes para avaliar, mas como pensei que aquele podia ser o último momento das duas, achei que era o melhor a ser feito. Fiquei uns 15 minutos ali a esperando falar tudo o que queria para a família! Até considerei deixar a mãe vir ao hospital, mas como isso poderia demorar muito tempo, e a paciente estava muito mal, tive que desistir (detalhe, ela só conseguiu falar ao telefone, pq temos um equipamento novo, chamado cateter nasal de alto fluxo que consegue entregar até 60L/minuto de oxigênio em alta concentração pelo nariz, deixando a boca livre).
Foi triste, muito triste…mas teria sido muito pior se não tivesse dado esses 15 minutos para ela e a família se falarem pela última vez. Cada vida, das 300 mil perdidas pela COVID tem um significado único e insubstituível na vida de alguém! Nunca devemos nos esquecer disto!
Fonte: Banda B