Lisa Montgomery, de 52 anos, se tornou na quarta-feira (13/1) a primeira mulher executada pelo governo federal americano em quase 70 anos. O último caso do tipo havia sido o de Bonnie Brown Heady, executada em 1953 na câmara de gás pelo sequestro e morte de um menino de seis anos de idade.
O caso teve reviravoltas de última hora nesta semana. Inicialmente a execução estava marcada para terça-feira, mas ela foi suspensa no dia anterior, depois que um juiz do Estado de Indiana levantou dúvidas sobre a capacidade mental de Montgomery.
Mas essa suspensão foi derrubada pela Suprema Corte, e Lisa Montgomery recebeu injeção letal nas primeiras horas de quarta-feira, na penitenciária de Terre Haute, em Indiana.
O crime cometido por Montgomery chocou os EUA e é descrito pelo Departamento de Justiça como “especialmente hediondo”: em 2004, ela matou uma grávida, cortou sua barriga e sequestrou o bebê.
Os abusos
Montgomery cresceu em uma família disfuncional, marcada por pobreza, violência, dependência de drogas e doença mental, na qual as crianças eram espancadas constantemente.
Seu pai abandonou a família quando ela era pequena. Sua mãe, Judy, casou seis vezes e teve vários outros parceiros. Ela é descrita em documentos sobre o caso como negligente e violenta.
A meia-irmã de Montgomery, Diane, quatro anos mais velha, começou a ser estuprada aos oito anos de idade, inicialmente por um amigo da mãe. Elas dormiam no mesmo quarto, e Montgomery, aos quatro anos de idade, assistia ao abuso sofrido pela irmã.
Assistentes sociais acabaram retirando Diane da casa, mas não Montgomery. A partir dos 11 anos de idade, Montgomery começou a ser abusada sexualmente pelo padrasto.
Os estupros aconteciam em seu quarto, e ele ameaçava estuprar sua irmã menor se ela resistisse e matar a família inteira se ela contasse a alguém. Em algumas ocasiões, ele batia com a cabeça da menina no chão de concreto enquanto a estuprava.
A família mudava de endereço frequentemente. Montgomery viveu em 17 lugares diferentes em seus primeiros 14 anos de idade. Quando se mudaram para um trailer em uma área isolada, ao final de uma rua sem saída, o padrasto ergueu um cômodo pequeno ao lado, onde podia estuprar a enteada sem ser perturbado.
Ao descobrir sobre o abuso, Judy culpou a filha. Quando Montgomery tinha 15 anos, começou a ser estuprada regularmente por vários outros homens, às vezes ao mesmo tempo, que eram levados ao local pela mãe e pelo padrasto, em troca de dinheiro. Segundo documentos sobre o caso, muitas vezes os homens urinavam na menina depois do ataque.
Ao longo dos anos, várias pessoas ficaram sabendo dos estupros, mas ninguém nunca reportou ou denunciou os abusos. Montgomery chegou a contar o que acontecia a um primo que era policial. Segundo documentos, ele disse que ela “chorava e tremia” enquanto relatava os estupros, mas ele também não denunciou o crime.
Vida adulta
Quando Montgomery tinha 18 anos de idade, foi pressionada pela mãe a casar-se com Carl Boman, filho de um namorado de Judy. Documentos sobre o caso dizem que Boman era abusivo. Ela teve quatro filhos em cinco anos.
Depois que Montgomery teve o quarto filho, sua mãe a pressionou a se submeter a esterilização. Ela se separou de Boman e depois casou-se pela segunda vez, com Kevin Montgomery.
A saúde mental de Montgomery continuou a se deteriorar com o passar dos anos e, segundo psicólogos e advogados que estudaram o caso, seu comportamento passou a ficar cada vez mais errático e ela não conseguia cuidar dos filhos nem de si mesma.
Dois dias antes do crime, Boman, o ex-marido, entrou na Justiça para obter a custódia de dois dos filhos do casal. Montgomery havia dito ao novo marido que estava grávida, e Boman sabia que isso era impossível, já que ela havia sido esterilizada.
Ele ameaçou expor a mentira e usar isso para garantir a guarda dos filhos. Não era a primeira vez que Montgomery fingia estar grávida.
Os danos
A psicóloga Katherine Porterfield, especializada no tratamento de sobreviventes de tortura e trauma, entrevistou Montgomery por vários dias em 2016, como parte do processo de apelação, e disse que o impacto do abuso foi enorme e que seu caso é um dos mais severos de dissociação da realidade que já viu.
No relato de suas conclusões, Porterfield escreveu que “os tipos de eventos traumáticos que Lisa viveu são capazes de gerar danos no desenvolvimento e personalidade” de uma pessoa.
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Fonte: BBC Brasil