A chance de Pepê chegar a terceira final pelo Grêmio nesta quarta-feira (29) em três anos na equipe profissional é algo que faz o antigo mentor dele se encher de orgulho e emoção.
O atacante, que será titular contra o São Paulo no Morumbi, às 21h30 (de Brasília), no jogo de volta da semifinal da Copa do Brasil, teve uma reviravolta na carreira há quatro anos.
Ele era um dos tantos desconhecidos do Foz do Iguaçu, equipe do interior do Paraná, no Campeonato Paranaense de 2016. Aos 19 anos e com uma passagem frustrada pela base do Athletico-PR, o garoto andava desanimado, sem perspectiva, quando teve uma ideia radical.
“Ele saiu de casa falando para os pais que não jogaria mais futebol, que iria desistir, que não queria mais jogar. Eu estava numa academia no centro de Foz do Iguaçu. Ele chegou e me chamou no canto e disse ‘Não quero mais, quero desistir’”, afirmou Ivan Carlos Mororo Alves para a ESPN.
Na época, este cearense de 47 anos, dos quais 46 morando em Foz do Iguaçu, estava trabalhando com o garoto há pouco mais de um ano. Ele não foi o descobridor de Pepê, mas acabou acolhendo Pepê no retorno dele do Athletico-PR.
Nenhum dos dois conseguia imaginar o cenário atual, no qual o atacante tornou-se um dos nomes mais valiosos do Grêmio, com uma multa rescisória de 150 milhões de euros (R$ 963 milhões).
As preocupações de Ivan Mororo estavam no trabalho no Estadual. Ele já carregava uma boa participação na Série D do Campeonato Brasileiro do ano anterior, torneio no qual Pepê estreou profissionalmente e ajudou o treinador a resolver um “B.O.”.
“Três partidas, três porradas. Aí a diretoria resolveu liberar o pessoal todo e falou ‘Ivan, agora vai com os meninos para acabar’. Eu reuni os garotos e falei: ‘Vocês não querem uma chance de ser atleta? Então, tá aí. A vida inteira vocês pediram uma chance”, disse.
A mudança fez a equipe vencer o primeiro jogo na Série D contra o Metropolitano-SC, mas a sequência não foi tão empolgante, com dois empates e duas derrotas. Pepê esteve em todos esses jogos e se destacou contra o Lajeadense-RS, com dois belos gols marcados na lembrança do treinador.
“Pensa em dois gols de qualidade, trabalhados. Essas cavadinhas que ele dá no Grêmio, ele já fazia na base. Tinha jogo na base que a gente ganhava de 10, 12, 15 gols, e ele fazia dois, três só com essa cavadinha. Nesse jogo ele fez um assim. O goleiro saiu e ele deu o tapa por cima”, disse Ivan.
Mas a boa participação em um campeonato já condenado para o Foz do Iguaçu não foi suficiente para dar uma injeção de ânimo no jovem. Após ser emprestado ao Coritiba para jogar a Copa São Paulo de 2016, o começo no Estadual profissional em que as coisas não andaram bem e muitos torcedores passaram a pegar no pé do jovem pesaram.
Primeiro, Pepê conversou com os próprios pais, que não conseguiram fazê-lo mudar de ideia sobre abandonar o futebol. Mas para completar a decisão ele precisava avisar o Ivan.
“Não vou repetir os palavrões que pronunciei, mas eu fiquei enfurecido. Não aceitava em hipótese alguma aquilo e disse que ele tivesse paciência, que era normal o que estava acontecendo. Ainda disse que se eu não tivesse visto nada nele, eu já o tinha liberado. ‘Quando acabar o campeonato, você pode fazer o que quiser da vida. Mas agora, não. Você vai continuar comigo até o final. Não era uma oportunidade que você queria? Tá aí a oportunidade. Você não vai desistir’”, relembrou.
Os motivos que fizeram Pepê pensar em abandonar o futebol nunca ficaram totalmente claros para Ivan. O que ele conta é que o garoto sofria muita pressão externa, de torcedores que o criticavam. Também carregava o peso da experiência ruim no Athletico-PR e pretendia trabalhar com o pai.
“Ele chegou meio perturbado na academia. Foi uma surpresa. Ele chegou tipo assim: ‘Estão me enchendo muito o saco e eu vou parar’. Eu não aceitei. Falei que ele tinha de acostumar com esse tipo de pressão. Se você tá bem, você é bom jogador. Se você tá mal, vai ser criticado. É normal. É isso agora e sempre. Conversando, a gente conseguiu fazer com que ele continuasse no futebol”.
Ida ao Grêmio
A persistência valeu. O Foz do Iguaçu chegou até as quartas de final da competição, quando foi eliminado pelo Paraná Clube em dois jogos. Pepê chamou a atenção de outros clubes, muito além das divisas do Estado.
“No segundo do jogo, nós ganhamos do Paraná por 2 a 1 e ele fez os dois gols. Foi ali que a ascensão dele começou. O pessoal do Grêmio observou ele, tinha observador técnico [no estádio] e aí levaram ele”, disse Ivan, orgulhoso de ter salvo o destino do jovem no futebol.
Uma pessoa que também acabou ajudando Pepê e ele nunca soube foi Aparecido Souza, conhecido no futebol como Kokan, 53, e que descobriu nomes como Miranda, Danilo Avelar e Zeca.
No jogo em que o garoto foi observado por profissionais do Grêmio, Kokan foi consultado sobre o jovem. Pode parecer pouco, mas o profissional tinha uma vasta experiência no trabalho de base do futebol paranaense e era um “velho fornecedor” de talentos ao clube tricolor.
“Como o Grêmio estava procurando um jogador que jogasse no último terço do campo, procurando um substituto para o Cebolinha, um dos observadores do Grêmio me ligou”, disse Kokan.
“Pepê era um garoto em formação ainda, treinado pelo meu amigo Ivan, que dizia que o menino seria um grande jogador. Nesse jogo contra o Paraná ele fez dois gols, outros times queriam levá-lo como Athletico-PR e Mirassol, mas o Grêmio foi mais rápido”, continuou.
Pepê trabalhou por um tempo na base gremista até ganhar a primeira chance no time profissional em 2018, quando fez 31 jogos e três gols. O curioso é que nessas três temporadas ele não teve o gostinho de atuar nos jogos em que o time levantou a taça do Campeonato Gaúcho.
Em 2018, não atuou nem esteve no banco na reta final. No ano passado, entrou no decorrer do primeiro jogo da final e ficou no banco na partida seguinte. Já em 2020 foi titular no primeiro duelo contra o Caxias, mas não esteve no segundo por causa de problemas musculares.
A Copa do Brasil é a chance de ele chegar a terceira final pelo Grêmio (quarta se for considerar que ele estava no elenco em 2019), mas a primeira de um torneio nacional.
Para que isso se confirme, o Grêmio pode empatar no Morumbi por ter vencido o primeiro jogo por 1 a 0, em Porto Alegre. Qualquer revés por um gol de diferença fará com que a classificação seja definida nos pênaltis. Derrota por dois ou mais gols para o São Paulo significa eliminação.
“O Pepê é um jogador iluminado, que sempre faz gols importantes. Acredito que ele possa ser o grande jogador do Brasil na Copa do Mundo de 2026”, disse Kokan.
Fonte: ESPN