A Associação dos Magistrados do Paraná (AMAPAR) emitiu uma nota de repúdio contra ataques que a justiça de Foz do Iguaçu recebeu após tirar a guarda de um bebê da mãe e passar para o pai. A mãe acusou a decisão de ter sido tomada devido ao fato de ela ser vegana. No entanto, em nota, a AMAPAR afirma que as decisões judiciais não levaram em conta considerações relacionadas à crença, à nacionalidade, à etnia ou qualquer outra que não fosse a primazia da proteção da criança e de seus direitos individuais de pessoa em desenvolvimento.
Confira:
A ASSOCIAÇÃO DOS MAGISTRADOS DO PARANÁ – AMAPAR, entidade que congrega os magistrados em exercício e aposentados do Estado do Paraná, diante da repercussão, nas redes sociais, sobre decisão judicial da Vara da Infância e da Juventude da Comarca de Foz do Iguaçu-Pr, envolvendo a parte Patrícia Garcia, vem a público prestar os seguintes esclarecimentos:
1. Em pedido de providências perante o Juízo de Direito da Vara da Infância e da Juventude da Comarca de Foz do Iguaçu, decorrente de comunicado do Centro de Nutrição Infantil de Foz do Iguaçu, equipes de atendimento atestaram que um bebê se encontrava em situação de risco, com necessidade de acolhimento em razão de seu quadro clínico de saúde e ausência de adesão ao tratamento por parte dos genitores, o que poderia ocasionar sequelas ao seu desenvolvimento.
2. Com acompanhamento do Ministério Público do Estado do Paraná, a Juíza de Direito determinou a realização de avaliações sociais, psicológicas e de saúde com os genitores da criança, que passaram a ser acompanhados por diversos órgãos, entre eles o Conselho Tutelar, a Secretaria Municipal de Assistência Social, por meio do Centro de Referência Especializado de Assistência Social – CREAS, o Serviço de Atendimento à Infância da Vara da Infância e da Juventude, o Centro de Referência em Atendimento à Mulher em Situação de Violência, o Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher e Anexo, o Serviço Social Distrito Norte da Secretaria Municipal de Saúde, bem como o próprio Centro de Nutrição Infantil de Foz do Iguaçu e o Núcleo de Apoio à Saúde da Família – NASF.
3. Em estudo de caso, os técnicos do Centro de Nutrição Infantil de Foz do Iguaçu, do Posto de Saúde Vila C, do CREAS e do NASF concordaram que o acolhimento institucional ou familiar da criança seria de extrema importância para esclarecer o seu diagnóstico, melhorar o prognóstico e recuperar e manter sua saúde, pois conflitos entre os genitores na Vara da Família prejudicavam a saúde da criança.
4. A rede de atendimento pontuou que a genitora ainda não havia compreendido o diagnóstico do filho e a demanda de cuidados que ele necessitava, sendo resistente aos encaminhamentos propostos pelas equipes da área de saúde por questões culturais e de convicções pessoais, inclusive com desrespeito ao estatuído no parágrafo 1º do artigo 14 do Estatuto da Criança e do Adolescente quanto à obrigatoriedade de vacinação das crianças nos casos recomendados pelas autoridades sanitárias.
5. Realizado, pelo Ministério Público, o pedido de acolhimento da criança, a Juíza de Direito determinou, no interesse desta, uma nova avaliação, pelo Serviço de Atendimento à Infância, de forma a ser verificada a possibilidade da permanência da guarda com a família natural, cuja conclusão foi a de que a concessão da guarda ao genitor seria a melhor solução, por ter ele demonstrado flexibilidade para ajustar horários de trabalho, atender os encaminhamentos recomendados e solicitar ajuda da família extensa, colocando como prioridade, acima de outras considerações, os direitos individuais do bebê.
6. Em razão dos elementos colhidos e para preservar o vínculo familiar, a Juíza determinou que a guarda da criança fosse passada ao genitor, bem como determinou o acompanhamento assíduo do núcleo familiar, por meio do CREAS do Município. Por terem os relatórios constatado que, após a concessão de guarda ao pai, não ocorreram outras situações de violação de direito aptas a ensejar a continuidade da medida de proteção, o feito foi extinto por sentença, o que possibilitou, naquele momento, que a criança permanecesse com o genitor.
7. A questão relativa à guarda da criança poderá ser discutida entre os genitores em outras demandas, em razão da ausência do caráter definitivo e possibilidade de revisão de guarda a qualquer tempo, sempre no melhor interesse da criança.
8. Em outra medida judicial requerida pela genitora, o Juízo da Vara da Infância e Juventude de Foz do Iguaçu deferiu tutela de urgência, em consonância com liminar também concedida em Mandado de Segurança com o mesmo objetivo, para garantir diariamente a amamentação da criança e sua permanência com a mãe por três horas, o que vem sendo realizado, para possibilitar o aleitamento materno em condições adequadas.
9. Houve, por parte do Juízo, a tentativa de utilização das técnicas de Justiça Restaurativa, para que os genitores construíssem uma solução não imposta pelo Poder Judiciário, porém a genitora não concordou em permanecer com os trabalhos.
10. As decisões judiciais não levaram em conta considerações relacionadas à crença, à nacionalidade, à etnia ou qualquer outra que não fosse a primazia da proteção da criança e de seus direitos individuais de pessoa em desenvolvimento.
11. O inconformismo com as decisões judiciais deve ser veiculado por meio dos recursos postos à disposição pelo ordenamento jurídico. A indevida utilização das redes sociais para desmerecer as decisões judiciais e a respeitabilidade da Justiça, incluindo a utilização de robôs para postagens automáticas em perfil institucional do Tribunal de Justiça do Paraná, em nada contribui para a solução adequada dos conflitos que envolvem crianças.
12. Assim, ao tempo em que a Associação dos Magistrados do Paraná repudia os ataques virtuais à respeitabilidade da Justiça, reitera sua total confiança na atuação da Juíza de Direito da Vara da Infância e da Juventude da Comarca de Foz do Iguaçu.
Curitiba, 14 de novembro de 2020.
GERALDO DUTRA DE ANDRADE NETO
Presidente da Associação dos Magistrados do Paraná