Medo da vacina, percepção equivocada de que ela não protege, avanço de informações falsas e falta de dinheiro para transporte até o posto de saúde estão entre fatores citados pelos municípios para explicar a dificuldade em atingir as metas de vacinação de crianças e gestantes contra a gripe.
A avaliação é de 198 municípios ouvidos em um levantamento feito pelo Ministério da Saúde durante a campanha de vacinação deste ano contra a influenza.
Para fazer a pesquisa, a pasta mapeou cidades que apresentavam índices de cobertura abaixo de 70% para esses grupos após a data prevista para o fim da campanha.
A meta nacional era chegar a 90% de imunização no país no grupo prioritário –composto principalmente por por idosos, gestantes, mulheres até 45 dias após o parto, crianças entre seis meses a menores de seis anos, indígenas, professores, trabalhadores de saúde, entre outros– o que só aconteceu após a campanha ser estendida para além do prazo inicial.
O levantamento foi feito por meio de formulário enviado pelo SUS (Sistema Único de Saúde). De 517 municípios acionados, 198 responderam.
Embora não representem uma explicação definitiva, os resultados ajudam a elencar algumas das hipóteses para a dificuldade em atingir as metas, situação que tem se repetido nos últimos anos.
Enquanto a cobertura geral do público prioritário para a vacinação foi de 91,5%, esse índice ficou em 84% para crianças e gestantes –que também fazem parte do grupo, mas –quando separados– apresentaram resultado abaixo do desejado.
O medo da população de possíveis eventos adversos à vacina é apontado como um fator de dificuldade para 77% dos municípios ouvidos. Outros itens apontados: percepção equivocada de que a vacina não protege (72%) e influência de informações falsas (51%). Mais de um item pode ser apontado por município.
Entram na lista também fatores sociais, como falta de dinheiro para transporte e distância dos pontos de saúde.
A pesquisa também mapeou problemas operacionais. Entre eles, estão dificuldade para usar o sistema de registro de dados do governo federal, problema relatado por 35% dos ouvidos, material informativo insuficiente (18%), dificuldades no acesso à internet (14%) e baixo número de doses para vacinação (6%).
Agora, o ministério iniciará uma pesquisa para ouvir 14 mil pais de crianças menores de seis anos para confirmar os motivos da não imunização. “Temos essa percepção local do motivo pelo qual os gestores acreditam que as pessoas não tenham ido se vacinar. Precisamos verificar na pesquisa, que é mais científica, se os dados vão bater ou não”, diz o secretário de Vigilância em Saúde, Wanderson Oliveira.
O objetivo é ter subsídios para elaborar materiais de comunicação e políticas públicas sobre o tema.
Para o diretor de doenças transmissíveis e imunizações, Júlio Croda, que acompanhou o trabalho, é preciso ver os dados com cautela por representar só uma parte dos envolvidos no processo.
“Parte desse discurso pode ser um subterfúgio do município por não ter atingido a meta. Pode ser que o gestor não assumiu seu papel mais atuante no sentido de ofertar a vacina em todos os horários possíveis, por exemplo. Por isso é preciso verificar a visão do usuário”, diz.
Isabela Ballalai, da Sbim (Sociedade Brasileira de Imunizações), reforça a necessidade de se ter pesquisas junto à população. “É uma percepção, mas não a resposta da população. Em 2016, todo mundo queria tomar a vacina, e havia fila nos postos”, afirma.
Segundo Isabela Ballalai, da Sbim (Sociedade Brasileira de Imunizações), não há motivos para a população ter medo de eventos adversos da vacina. “O que as pessoas têm na realidade é medo de que cause doenças, medos baseados em mitos. E não de evento adverso, que é a dor no braço. É uma vacina supersegura”, diz.
Questionado, o ministério diz que os problemas no sistema já foram corrigidos. Os demais pontos serão avaliados para as próximas campanhas, informa.
Outros fatores
Cidades com maior número de agentes comunitários de saúde tiveram maiores coberturas durante o período. Na mesma análise, cidades com menos de 50 mil habitantes apareceram com índices melhores.
O número maior de salas de vacina também apareceu como fator positivo para aumento da cobertura no Sul, Sudeste e Centro-Oeste. “Isso indica que existia um problema de acesso nesses locais. Hoje, a mulher tem um calendário de trabalho muito próximo ao do homem. Ter horários alternativos pode facilitar esse acesso à vacinação”, avalia Croda.
A tentativa de ampliar os horários de vacinação é um dos pontos de um programa anunciado pelo ministério neste ano, chamado de Saúde na Hora. A estratégia, porém, tem foco apenas em grandes cidades.
Nas demais, são avaliadas medidas como a responsabilidade civil e penal do médico em caso de contraindicação da imunização.
A iniciativa está em negociação com o CFM (Conselho Federal de Medicina). “Queremos fazer um ataque direto ao movimento antivacina de forma mais dura”, afirmou Oliveira ao anunciar a medida a secretários. Questionado, o CFM disse que ainda vai discutir o tema.
Ainda de acordo com Oliveira, outro ponto em estudo é fazer uma parceria com clínicas privadas para verificar o número de doses aplicadas e aumentar a transmissão de dados sobre aquelas direcionadas ao público a quem a vacina é recomendada no SUS.
A estimativa é que, somente para a vacinação contra a gripe, 8 milhões de doses tenham sido aplicadas nesses locais. Não há dados de quais os grupos beneficiados.
Em outra frente, o ministério também avalia maneiras de aumentar a cobrança de apresentação da carteirinha nacional de vacinação em diferentes momentos, como na escola, no alistamento militar e em avaliação periódica nas empresas, sem que haja vinculação com uma obrigatoriedade.
Para isso, a ideia é lançar um modelo de certificado digital de vacinação. Uma primeira versão já pode ser acessada por meio do aplicativo MeuDigiSUS, embora com dados restritos a crianças com registros de vacinas mais recentes em cidades que tenham prontuário eletrônico.
Fonte: Banda B