A Divisão Estadual de Narcóticos (Denarc) da Polícia Civil do Paraná prendeu nos primeiros quatro meses do ano 147 pessoas envolvidas no tráfico de drogas. Também foram recuperados 71 veículos e 46 armas de uso restrito, além de cerca de 23 toneladas de maconha, 5 toneladas de cocaína, mais de 200 quilos de crack e quantidades expressivas de haxixe, LSD, ecstasy e sintéticos. Dados da Secretaria de Segurança Pública apontam crescimento de 47,6% na apreensão de ecstasy e 29,9% na de crack em relação aos primeiros meses do ano passado.
Esses números, no entanto, são apenas a ponta de um iceberg que é descortinado dia após dia com ações estratégicas. Segundo o delegado Ítalo Biancardi Neto, responsável pelos oito núcleos estaduais da Denarc, os números evidenciam a estratégia de combate ao crime organizado operacionalizada a partir do ataque a toda a cadeia, da fabricação de drogas ao transporte e comercialização.
Os objetivos são retirar as drogas de circulação das ruas com eficiência e impedir que esse mercado prolongue a promiscuidade com criminosos que cometem furtos, roubos, homicídios e lavagem de dinheiro.
“Nós atacamos a posse, o transportador, o fornecedor, o chefe da célula e os patrões do grupo. Com muita inteligência”, afirma o delegado Biancardi. “Nosso objetivo é trabalhar de forma abrangente, sem escolher uma determinada variável e ficar apenas nela para engrandecer esses números. Cada núcleo tem a sua região de abrangência e suas preocupações. A ideia é olhar isso de forma global. De todas as variáveis do narcotráfico, do varejão aos entrepostos. E, principalmente, onde acontecem os problemas decorrentes como homicídios, prostituição, aliciamento de crianças e as áreas próximas às escolas”.
INTEGRAÇÃO – Faz parte da estratégia da Denarc, incentivada pela Secretaria de Segurança Pública, a integração das forças das polícias civil e militar para ajudar a conter o abuso do uso de drogas e a oferta nas ruas. As dificuldades passam pelo tamanho do mercado consumidor e pela pulverização em todas as classes sociais.
O delegado destaca que tem muita gente consumindo, de todas as classes. A diferença é o nível econômico. “Quem tem dinheiro usa LSD, ecstasy, cocaína, MDMA. Maconha e crack são mais acessíveis a classes menos afortunadas. Mas todas estão consumindo e consumindo muito. Isso retroalimenta o narcotráfico”, explica o delegado. “Esse é um sistema empresarial. Como a demanda é grande, a oferta também aumenta”.
“Segundo as últimas pesquisas, o consumo tem crescido em todo o País, que está prestes a se tornar o segundo maior mercado consumidor de cocaína do mundo, atrás apenas dos Estados Unidos. O Brasil é uma rota de exportação, mas também lugar de chegada para consumo. Isso dá a dimensão do problema e dos crimes que estão conectados”, diz Biancardi.
NOVAS SOLUÇÕES – Esse trabalho integrado com outros órgãos de investigação permite, também, a elucidação de crimes que demorariam mais para sair das fichas policiais. Segundo Ítalo Biancardi Neto, mais de 90% dos crimes de homicídio estão vinculados ao narcotráfico direta ou indiretamente, o que amplia a necessidade dessa comunhão.
O País ainda assiste cerca de 60 mil assassinatos todos os anos. No Paraná, são cerca de dois mil, número que caiu 10% de 2017 para 2018. Neste ano, de janeiro a março foram registrados 381 homicídios dolosos, contra 558 no mesmo período de 2018. A redução chegou a 32%. Os números são do relatório estatístico da Secretaria da Segurança Pública e Administração Penitenciária.
O delegado usa como exemplo a prisão de um integrante de uma organização criminosa em fevereiro deste ano. Ele foi detido em Curitiba e portava uma pistola de calibre 9mm. O compartilhamento de informações dessa prisão com a Divisão de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) da capital permitiu a identificação dele como autor de três homicídios.
Para aumentar o poder de controle e a troca de informações sigilosas das investigações, a Denarc, explica o delegado, vai buscar estreitar parceria também com a Delegacia de Furtos e Roubos e a Delegacia de Furtos e Roubos de Veículos. “As divisões têm que se integrar, conversarem, como a Denarc e a DHPP. O trabalho de elucidação dos homicídios acaba enveredando para o narcotráfico, e as investigações dos cartéis interessam muito aos policiais da Homicídios. É uma diretriz do departamento para que haja cooperação inclusive entre interior, capital e região metropolitana”, destaca.
MAIS CONECTADOS – Esse planejamento leva em consideração o modelo de funcionamento dos cartéis de drogas no século 21. Segundo Biancardi, eles já foram centrados em grandes narcotraficantes e rotas específicas. Atualmente são menores, mais conectados e difíceis de serem identificados por conta da lavagem de dinheiro.
“Os grandes cartéis se subdividiram. São menores, usam mais rotas, tem mais gente envolvida no processo. E temos também o tráfico invisível, que para a repressão gera mais complexidade, que é a lavagem de dinheiro”, explica.
“De modo geral o cenário ainda é muito delicado, independente desse foco macro sobre a área. A região de Foz do Iguaçu, Pato Branco e Maringá concentram parte das drogas da Bolívia, Peru e Paraguai. É uma preocupação pelo transporte. Quando chega a Curitiba a droga pulveriza muito rápido e fica mais complexo pegar o cabeça. Nesse setor predomina a lei do silêncio. São inúmeras dificuldades”, complementa.
FRONTEIRA – Segundo o delegado-geral da Polícia Civil do Paraná, Silvio Rochemback, os objetivos da repressão passam também pela estratégia de fronteira. “O que dificulta o nosso trabalho é a extensão da nossa fronteira. Ano a ano o índice de apreensão e a quantidade de operações de repressão qualificada para desarticular organizações criminosas aumentam”, afirma. “A cada ano intensificamos o trabalho de inteligência para que os ataques da Polícia Civil sejam cirúrgicos, de forma a cortar a cadeia de fornecimento das drogas que entram pelo Paraná e são distribuídas em outros estados”.
PROBLEMA SOCIAL – Ao mesmo tempo em que atua na repressão ao crime organizado, a Polícia Civil mantém nas estruturas da Denarc o Centro Antitóxicos de Prevenção e Educação (CAPE), em que policiais fazem atendimento à sociedade. Eles têm como meta esclarecer a comunidade a respeito da drogadição, principalmente de adolescentes, bem como formar agentes multiplicadores para o combate ao uso de entorpecentes. Os policiais também encaminham seus assistidos a entidades públicas ou privadas que controlam dependência física ou psíquica.
As dificuldades aumentam porque a sociedade está doente, segundo o delegado do Denarc. “Estamos trabalhando toda essa conjuntura para, do ponto de vista da inteligência, impactar determinados locais e regiões do Estado. Um trabalho que não se encerra na repressão ao tráfico. Há um esforços contra a lavagem de dinheiro, os laboratórios de sintéticos, os entrepostos. Estamos diante de um problema abrangente, temos que pensar de forma complexa daqui para frente”, completa.
MOBILIZAÇÃO – Para ajudar a compreender e discutir todas essas questões, o governador Carlos Massa Ratinho Junior lançou na terça-feira da semana passada (04.06) a campanha “Junho Paraná sem Drogas”, que foi instituído pela Lei Estadual 19.121/17. A proposta é promover durante todo o mês ações para esclarecer a população sobre os riscos do uso e abuso de álcool e outras drogas, e incentivar a busca de orientação, esclarecimento e tratamento, disponível na rede pública de saúde.
AEN