Trajetórias de vida e percepções de estudantes da rede pública, inseridos no contexto urbano da Tríplice Fronteira, foram pontos de partida para debates dentro do projeto de extensão da UNILA “Urbanismo nos territórios de fronteira: discutindo o direito à cidade nas escolas”. Desde o início de 2015, o projeto realiza um encontro entre as Geografias Acadêmica e Escolar, bem como entre estudantes brasileiros e paraguaios – suas significações, identidades e realidades. Participaram das atividades alunos do 1º ao 3º ano do Ensino Médio do Colégio Estadual Costa e Silva, de Foz do Iguaçu, e da Escola Centro Regional, de Ciudad del Este.
“O projeto discute conflitos, contradições e dinâmicas do cotidiano das cidades em região de fronteira, a partir das escolas, que são espaços públicos privilegiados para esse debate, por abrigar estudantes com culturas, trajetórias de vida e origens diversas”, explica o docente de Geografia da UNILA e coordenador do projeto, André Luis André. Ele defende a aproximação da Universidade com o ambiente escolar e, ainda, a importância de teorias empíricas da cidade, priorizando como ponto de partida a experiência na realidade local, de onde nascem confrontos com questões que, muitas vezes, o aporte teórico não consegue responder.
O projeto está centrado nas dinâmicas presentes no espaço urbano trinacional de Foz do Iguaçu, Ciudad del Este e Puerto Iguazú. “São cidades construídas no contexto de periferias dos Estados, porém dentro de um circuito internacional, com infraestrutura de aeroportos e turismo, por exemplo. São dois mundos em uma mesma cidade: um com uma dinâmica global, multicultural; e outro, com problemas típicos de cidades latino-americanas nas áreas de saúde, transporte, violência e educação”, contextualiza o professor. Ele integra o projeto com quatro estudantes de Geografia da UNILA.
Atividades, alteridades e debate
Nos meses de outubro e novembro, os acadêmicos da UNILA realizaram uma série de atividades com alunos das escolas Centro Regional e Costa e Silva. “Pudemos verificar a necessidade de estudar o cotidiano dos estudantes, inclusive para gerar um interesse deles na sala de aula. Dos alunos brasileiros, percebemos que estão presentes problemáticas de violência, do trabalho e da inclusão social”, exemplifica o estudante Luiz Felipe Rodrigues, voluntário do projeto. Os acadêmicos da UNILA relatam, ainda, que muitos alunos paraguaios tinham o imaginário de um Brasil com problemáticas bastante diferentes em relação ao país deles. “No entanto, a partir das discussões, eles descobriram que partilhamos dos mesmos problemas”, complementa o acadêmico.
A partir das questões levantadas pelos alunos da escola, procurou-se trabalhar as percepções e os sentimentos, por meio de debates e reflexões sobre a vivência em cidades localizadas em regiões de fronteira. Metodologias criativas alimentaram discussões – como uso da imagem de grafites de Ciudad del Este e Foz do Iguaçu, para instigar o debate sobre direito à cidade, manifestações e sentimentos coletivos de pessoas marginalizadas da cidade formal. Os alunos das escolas também mostraram suas percepções e representações sobre o espaço da cidade, por meio de desenhos e frases, tal como manifestações urbanas feitas em muros.
Em cinedebates, com a exibição do filme Central do Brasil, surgiu a discussão sobre diferenças regionais e analfabetismo. Outra atividade promovida pelo projeto foi o “encontro” entre os estudantes de Foz do Iguaçu e Ciudad del Este, por meio da troca de cartas. Assim, eles puderam conhecer a realidade do país vizinho, a partir do olhar de outros alunos da rede pública. “A atividade foi um intercâmbio em que os estudantes puderam perceber que, apesar das diferenças, há muitos pontos em comum entre as duas cidades”, conta o voluntário Luiz Felipe.
Formação e aprendizados mútuos
Os estudantes de Geografia da UNILA relatam que o projeto também foi uma oportunidade de aprender sobre a realidade do ensino nas escolas públicas da região. “Pude verificar que dar aula não é uma tarefa fácil, mas quando começamos a levar questões do cotidiano dos alunos, houve um trabalho participativo, com a valorização da percepção deles”, coloca a acadêmica Dalila Tavares.
“Esse projeto foi uma forma de descobrir realidades que não aprendemos na Universidade. Inclusive, muitos dos alunos das escolas enxergam a universidade como um lugar distante. E, com nosso próprio exemplo e de outros estudantes da UNILA, mostramos que é possível chegar ao ensino superior. Nos colocávamos com pé de igualdade com os alunos e foi um aprendizado mútuo”, descreve o estudante Luiz Felipe.
O projeto de extensão serviu, ainda, como incentivo na formação dos estudantes da UNILA, que demonstraram interesse em seguir o trabalho dentro do ambiente escolar. “Os alunos foram protagonistas do projeto. E, caso sigam a carreira de professor universitário, seguramente ficarão incomodados em não realizar projetos de extensão. Foi uma semente plantada”, conclui o docente André Luis André.
Unila