A jornalista e fotógrafa gaúcha Dulce Helfer teve o privilégio de ser amiga do poeta e tradutor Mario Quintana, o grande homenageado da 11ª Feira Internacional do Livro de Foz do Iguaçu. Foram dez anos de convivência intensa, entre duas e três vezes por semana, até a morte do escritor em 1994.
Para contar um pouco sobre essa amizade, ela participou do evento literário no sábado à noite, acompanhada do jornalista e cineasta Tabajara Ruas – com quem escreveu o livro Mario, assinado também pelo teólogo, poeta e ensaísta Armindo Trevisan.
Num papo descontraído com o público, Dulce revelou histórias sobre Quintana, mostrou fotografias que fez dele e declamou, assim como Tabajara, alguns dos poemas do amigo. “Ele meu deu muito mais do que pude retribuir. Eu via Mario como um amigo, não como o grande escritor que foi. Isso acontece quando as pessoas são íntimas.”
A jornalista contou que o poeta gaúcho sempre procurou o reconhecimento de suas obras, porém não gostava de tietagem. Talvez isso se devesse ao fato de ele ser uma pessoa solitária, que nunca se casou e sofreu com o alcoolismo até os 60 anos de idade. Exotérico, Mario Quintana “era cavalo de fogo no horóscopo oriental e acreditava que não poderia se casar para não desestruturar a família. Ele levava a sério o exoterismo, numerologia e lia a sorte e horóscopo”.
A grande paixão
Embora não tenha se casado, Quintana nutria uma paixão secreta por Cecília Meireles, que conheceu em 1935. Ele nunca revelou seu amor porque era amigo do marido da poetisa carioca, mas ela foi sua musa inspiradora em alguns poemas, como nos versos: “Senhora, eu vos amo tanto que até por vosso marido me dá um certo quebranto”.
Esse sentimento e ao mesmo tempo drama íntimo rendeu uma história contada por Dulce. Certa vez, Quintana e um amigo, o qual também seria apaixonado por Cecília, foram convidados a tomar chá com ela – algo comum na época. Nervosos e assíduos frequentadores de botecos no Rio de Janeiro, passaram em alguns desses estabelecimentos no caminho da casa da poetisa para tentar quebrar a tensão. Resultado: nunca chegaram.
Traduções e poesias
O jornalista Tabajara Ruas contou que Quintana foi criado em uma família bastante envolvida com a política em Alegrete, Rio Grande do Sul, no início dos anos 1900. Nesse período, o estado envolveu-se em vários conflitos, o que despertava todo tipo de cuidado. Como havia pessoas infiltradas na cidade e seu pai era considerado um conspirador, como o próprio Mario revelou mais tarde, a família só falava em francês dentro de casa, até para que os empregados não entendessem.
Mas essa fluência na língua francesa também o ajudou na carreira, pois o escritor traduziu 50 obras para o português, tanto do francês quanto de outros idiomas. Entre elas, Em busca do tempo perdido, de Marcel Proust. “Entre os poemas de Mario, embora seus temas fossem coisas simples do cotidiano, a natureza, a ternura nos versos, havia também uma poesia intimista, que retratava a tristeza e a morte”, disse Tabajara.
De acordo com Dulce, o poeta tinha medo da morte e, inclusive, não gostava de comemorar aniversários por acreditar estar mais perto dela. Porém ela veio no dia 5 de maio de 1994, em Porto Alegre, após Quintana ser internado com problemas respiratórios aos 87 anos.
Assessoria