Uma pesquisa inédita sobre o gato-do-mato (Leopardus tigrinus), realizada no Refúgio Biológico Bela Vista (RBV) nesta segunda (24) e terça-feira (25), vai levantar informações importantes sobre a espécie. Quatro professores e seis alunos do Curso de Medicina Veterinária da Universidade Federal Fronteira Sul (UFFS), de Realeza (PR), sob a coordenação de profissionais de Itaipu, analisaram quatro aspectos: protocolo anestésico, avaliação ocular, auditiva e cardíaca. Esse é o mais completo estudo feito sobre a espécie no mundo.
O trabalho foi concluído com um check-up para verificar o estado de saúde do animal. Foi analisada a saúde bucal e foram coletadas amostras de sangue para verificar o funcionamento de órgãos, como rins e fígado, além de um radiograma do tórax. Nos dois dias, foram estudados 15 exemplares de gato-do-mato, todos do plantel do refúgio. O número de espécimes permite aos pesquisadores extrapolar dados de forma estatística para toda espécie e criar parâmetros nos quatro temas estudados, que possam servir de base para futuros estudos.
Antes do procedimento, o animal é pesado e sedado. O protocolo de anestesia, que não existia antes do estudo, foi criado. Para isso, foi medida a dosagem do relaxante muscular, anestésico e analgésico e sua influência na pressão arterial, na frequência cardíaca e na sensibilidade do animal.
Visão apurada
Para se ter ideia do ineditismo da pesquisa, até antes do estudo, não existia no mundo todo informações sobre as características dos olhos do gato-do-mato. “Fizemos uma avaliação oftalmológica completa”, explica o professor de clínica cirúrgica da UFFS, Gentil Ferreira Gonçalves. “Medimos a produção de lágrimas, a pressão interocular, e mensuramos o bulbo ocular com o ultrassom”.
Uma das possíveis conclusões diz respeito à diferença da visão do gato-do-mato e do gato doméstico (Felis catus). A espécie estudada tem uma acuidade visual mais apurada, visto o tamanho e disposição das estruturas dentro do olho, conclui o especialista. A causa pode ser a necessidade, na vida silvestre, de caçar e se defender dos predadores.
Membrana nova
Outra informação inédita foi uma pequena cartilagem encontrada entre os dois canais, vertical e horizontal, do ouvido do gato-do-mato, que não existe no gato doméstico. “Não podemos nem nomear esta cartilagem porque nunca vimos isso em outro animal”, diz a professora de obstetrícia e técnica cirúrgica, Fabíola Dalmolin.
Com um aparelho de videotoscopia do RBV, foi analisado o ouvido do animal. A nova estrutura foi confirmada com um posterior raio-x de cabeça. “Talvez esta cartilagem possa ter relação com a acústica, já que o gato-do-mato depende da audição para se proteger dos predadores”, teoriza.
Saúde cardíaca
Segundo a professora de Clínica de Animais de Companhia, Tatiana Champion, os estudos cardíacos analisaram a saúde de cada animal, mas, neste caso, não podem ser extrapolados para toda espécie. “O número de animais estudados é pequeno para definirmos, por exemplo, se a espécie tem predisposição a uma cardiopatia”, explica.
Mas a análise ajuda a identificar com antecedência insuficiências e arritmias, já prevendo o uso de medicamento contínuo no futuro. Em cada animal, foi feito o eletrocardiograma, o ecocardiograma, além de uma radiografia do tórax, que verificou o estado do pulmão.
Perpetuação do conhecimento
Para o médico-veterinário Zalmir Cubas, da Divisão de Áreas Protegidas (MARP.CD), que o coordenou o trabalho, a parceria com a academia é fundamental para perpetuação do conhecimento. “Nós temos o plantel dos animais, mas não somos especialistas nestas áreas. Os alunos vão produzir artigos e trabalhos, serão eles que continuarão os estudos e o compartilhamento do conhecimento”, conclui.
Segundo Zalmir, outras pesquisas como esta podem ser feitas em espécies como a jaguatirica (Leopardus pardalis) e o gato-maracajá (Leopardus wiedii), este último, animal ameaçado de extinção. Um curso de ecocardiograma em animais silvestres também pode ser realizado no Hospital Veterinário do RBV.